Olhar estrangeiro

Jon Vought, em Olhar estrangeiro

“Olhar estrangeiro” é um filme sobre os clichês e as fantasias que se avolumam pelo mundo afora sobre o Brasil. Baseado no livro “O Brasil dos gringos”, de Tunico Amâncio, o documentário mostra a visão que o cinema mundial tem do país. Filmado na França (Lyon e Paris), Suécia (Estocolmo) e EUA (Nova York e Los Angeles), o filme, através de entrevistas com os diretores, roteiristas e atores, desvenda os mecanismos que produzem esses clichês.

Entrevistados

Bo Jonsson: Produtor de dois filmes rodados no Brasil. O primeiro (Svarta Palmkronor – Black Palm Trees), em 1967, com Max von Sidow e Bibi Andersson, dirigido por Lars-Magnus Lindgren, que havia ganhado o Oscar dois anos antes, é descrita por ele como uma odisséia do que o Brasil pode fazer com um sueco. O diretor acabou internado louco. O segundo exemplifica o clichê típico: dois suecos acabam o filme fugindo para o Brasil para gastar uma fortuna.

Charlie Peters: Roteirista do filme “Feitiço no Rio” (Blame it on Rio), dirigido por Stalen Donen. O filme, com Michel Caine e Demi Moore, ainda adolescente, foi rodado no Rio e é uma sequência de clichês sem a menor preocupação com a realidade. Na entrevista, Charlie aceita os clichês como parte do mundo do filme comercial.

David Weisman: Produtor do filme “O Beijo da Mulher Aranha” de Hector Babenco. Esteve no Brasil várias vezes, tendo uma relação muito forte com o país. Como o nosso documentário trata apenas de filmes estrangeiros referentes ao Brasil, não nos ocupamos do “Beijo” durante a entrevista, mas da tentativa de se produzir o filme “Samba”, que seria filmado por Bob Rafelson e teria Sônia Braga e Jack Nicholson nos papéis principais. A história do diretor sobre um cumprimento universal dos negros revela, de maneira irônica e às vezes cruel, a forma como se realiza esse “olhar estrangeiro”. Mas é também uma tentativa frustrada de se fazer um filme além dos “clichês”.

Édouard Luntz: Filmou no Rio e em outros estados do Brasil “Le Grabuge” em 1968. O cineasta que poucos anos antes fez grande sucesso em Cannes com um filme sobre meninos marginais recebeu um convite da 20* Century Fox para fazer um longa. No último momento, porque a Fox tinha um dinheiro congelado no Brasil, as filmagens forma transferidas para o Rio. As peripécias da realização desse longa em plena efervescência de 68 é também a luta de um francês, com um lado documentarista muito forte, pelo seu “direito de autor”. Depois de anos de luta, Luntz ganhou na justiça o direito de ter a sua versão do filme, considerado “anti-establisment” nos EUA, mas a Fox em resposta destruiu o filme. Boa história sobre como funciona o chamado cinema hegemônico quando é contestado. Só existem fotos do “Le Grabuge”, uma tentativa de trabalhar fora dos clichês. Uma entrevista com um diretor engolido pelo sistema.

Gerard Lauzier: Diretor de dois filmes que falam do Brasil: “T’empêche tout le monde de dormir”, de 1982, e “O filho do francês”, de 2000. Conhecido desenhista de quadrinhos – um mito na França – morou no Brasil oito anos quando jovem e usa essa experiência em seus filmes. Imenso contraste entre os filmes, cheios de clichês, e sua própria experiência no país. Perguntado sobre essa contradição, dá uma excelente entrevista sobre o poder da indústria, o que o público quer ver e o Brasil que é vendido – o pobre, o rural e o exótico.

Greydon Clark: Diretor do filme “Lambada, a Dança Proibida”. O filme mistura a dança lambada, que acabava de estourar na Europa, com a questão da floresta amazônica, criando uma “princesa índia”. O diretor fala como “criou” essa história filmada na Flórida e sobre o poder da indústria , da necessidade de se entreter o público norte-americano. Lambada foi, segundo conta, um filme altamente lucrativo.

Hope Davis: Atriz principal do filme “Próxima Parada, Wonderland” (1999), dirigido por Brad Anderson. O filme mostra um personagem brasileiro que fala em espanhol e é recheado de músicas brasileiras. Hope Davis, em sua entrevista, mostra desconhecer totalmente o Brasil e o associa aos principais clichês: praias, top-less e sensualidade. Fala criticamente sobre o “latin lover”, personagem também apresentado no filme, que apesar de tudo foi muito bem recebido no Brasil.

Jon Voight: Atuou em dois filmes da nossa lista: “O Campeão” (1976) de Franco Zeffirelle e “Anaconda” (1997) de Luis Llosa. O primeiro traz uma pequena citação ao Brasil, referente ao “paraíso” e o segundo foi rodado na Amaz“politicamente incorreta” dos filmes americanos das décadas passadas sobre a Amazônia eram causados pela impossibilidade técnica de se filmar na floresta, e que agora isso está mudando graças às novas tecnologias.

Larry Gelbart: Um dos roteiristas do filme “Feitiço no Rio” (1984), que de uma maneira mais afetiva traz os mesmos tipos de clichês do filme “Orquídea Selvagem”. Também foi roteirista de “Tootsie” e “M.A.S.H.”. Com humor e inteligência, fala de como o cinema cria e perpetua os clichês. Comenta os erros do filme, como o top-less e o casamento brasileiro. Cita Carmem Miranda como uma das responsáveis pela idéia de Brasil que os americanos tem.

Michael Caine: protagonista de “Feitiço no Rio” (1984). Fala, bem humorado, da beleza do povo brasileiro como razão para alguns clichês e que acreditou em tudo que leu no roteiro do filme. Pressionado, muda o tom e fala das diferenças sociais no Brasil. Perguntado sobre a influência de Carmem Miranda, diz que não sabia que ela era brasileira.

Philipe de Brocca: Diretor de “L’homme de Rio”, um dos maiores sucessos da época (1962), com mais de cinco milhões de espectadores na França. Belmondo e Francóise D’Oleac no seu melhor estilo num filme cheio de clichês para toda a família, com o charme francês. A entrevista de Philippe revela o mais puro “amor colonial” pelo Rio de Janeiro dos 60, a compreensão dos clichês (faz uma comparação excelente de que os brasileiros devem reagir vendo seu filme como ele reage vendo os americanos filmando em Paris). Não esconde seus clichês: no item trabalho, diz que não consegue imaginar um filme com um brasileiro trabalhando. A entrevista esbanja nostalgia e declarações de amor por um Rio de fantasia. Há dois anos fez uma nova aventura na Amazônia (lado Venezuelano) também com Belmondo, que foi um grande fracasso.

Philippe Clair: Autor e diretor de “Si tu vas à Rio, tu meurs”, filme que descobriu a Roberta Close, lançando-a internacionalmente. Comediante da velha escola do vaudeville, Philipe Clair dá uma entrevista extremamente engraçada sobre sua experiência brasileira. Um show de clichês do cidadão típico de classe média: mulher e bundas fazem o país.

Robert Ellis Miller: Diretor do filme “Brenda Star” (1988), estrelado por Brook Shield e também filmado na Flórida. O filme trabalha com uma personagem dos quadrinhos que toma vida e vai a Amazônia. Em sua entrevista, defende os clichês em segundo plano, como atalhos para localizar a história para o público. Diz que Carmem Miranda hoje seria um cartoon. Fala da teoria de que o filme americano tem algo de especial que o faz ser mais popular que os outros. Defende a necessidade de se falar em espanhol na Amazônia brasileira porque a “a maior parte da região fala espanhol e é assim que o estúdio decide”.

Tony Plana: Ator cubano americano que estrelou, com Raul Julia, o filme “Amazônia em Chamas” (1994), sobre a vida de Chico Mendes. O filme, rodado na Amazônia, é falado em inglês e estrelado por atores americanos do tipo “latino”. O ator descreve como o mercado cinematográfico americano desconhece a diversidade da cultura latina, preferindo criar um latino padrão.

Zalman King: Diretor de “Orquídea Selvagem” (1990), filme com conotações eróticas, estrelado por Mickey Rourke. O filme se passa em um Rio imaginário, junção de Rio de Janeiro com Bahia, e contém uma quantidade enorme de clichês, tais como sensualidade selvagem, candomblé e sexo, samba e carnaval. Na entrevista, Zalman King conta que sua visão de Brasil foi influenciada pelo filme Orfeu Negro e que queria um lugar exótico.

Bernard Corneloup: curador do Festival Ibero-Aamericano de Lyon . Sobre o que o público francês quer ver e o poder dos distribuidores

Alain Liotard: diretor do festival ibero-americano de Lyon e diretor da cinemateca de Lyon. Também sobre o que o público francês quer do Brasil

Jacki Bruet: diretora do Festival Internacional de Mulheres de Creteil. Sobre a questão do feminismo, da sensualidade latina, preconceitos, etc

Foram realizadas ainda cerca de 100 pequenas entrevistas com espectadores franceses , suecos e norte-americanos num mesmo cenário (um fundo verde ou um fundo amarelo) como se fosse uma cabine onde trabalhamos com um jogo em que foram propostos as seguintes palavras que deveriam ser referenciadas ao que eles imaginam que seja o Brasil.

Festivais

Festival Internacional do Rio de Janeiro 2005
Mostra Internacional de São Paulo 2005
FestCine Goiânia 2006 (Prêmio de Melhor Edição)
Festival Latino Americano de Los Angeles (EUA) 2006
Brasil Plural (Alemanha) 2006
Festival du Film Brésilien de Paris (França) 2006
Cine Las Américas (EUA) 2007 Hot Docs (Canadá) 2007
Festival du Film Brésilien de Montreal (Canadá) 2007
Toronto Brazil Film Fest (Canadá) 2007
Focus Brasil (Espanha) 2007
Festival de Maringá 2008

Olhar estrangeiro

Créditos

Uma Produção Taiga, Limite e Okeanos
Produção executiva: Luís Vidal e Paola Abou-Jaoude
Roteiro: Lucia Murat e Tunico Amancio
Direção de arte: Caco Moraes
Edição de som: Simone Petrilho
Mixagem: Cláudio Waldetaro
Edição: Julia Murat
Fotografia e câmera: Dudu Miranda
Argumento e direção: Lucia Murat
Animações adicionias: Fernanda Ramos, Phil e Reyson Carlomango
Assistente de arte: Bruna Murat e Thiago Sacramento
Pré-edição: Adriana Borges e Rodrigo Hinrichsen
Assistente de edição: Rodrigo Carvalho
Assistentes de produção: Carolina Oliveira, Giselle Haimovitz, Ivan S. Cruz e Nicolau Roiter
Câmera adicional: Julia Murat e Liana Brazil
Consultor de edição: Cezar Migliorin e Natara Ney
Pós-produção: Julia Murat, Leo Hallal e Natara Ney
Colorista: Leo Hallal
Assessoria jurídica: Dario Corrêa
Financeiro: Ana Paula de Lemos e Nei Belo de Souza
Ilustrações: Caco Moraes
Animações: Massachi Lima Hosono
Produção EUA: Ângela Pontual e Paula Abou-Jaoude
Produção França: Gabriela Lins e Silva e Juliana Aguiar
Produção Suécia: Fernando Usiglio
Produção Brasil: Júlia Cômodo, Ludmila Olivieri e Mariana Seivalos
Produtores: Dudu Miranda, Lucia Murat, Luis Vidal e Paula Abou-Jaoude